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É o fim da escravidão? Exposição “Histórias Afro-Atlânticas”, em São Paulo, discute o tema

“O período pós-abolição da escravidão no Brasil ainda não acabou.” A frase repetida inúmeras vezes pela historiadora, antropóloga e curadora Lilia Moritz Schwarcz fica evidente na exposição Histórias Afro-Atlânticas, em cartaz no Masp e no Instituto Tomie Ohtake, ambos em São Paulo, até 21 de outubro.

A mostra nos relembra pontos importantes da história brasileira: nosso País recebeu 46% de todos os escravos africanos comercializados nas Américas em um regime opressor que durou quase 400 anos. Fomos um dos últimos a abolir a escravidão com a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, que, no entanto, não previu um projeto de integração social, perpetuando até os dias atuais desigualdades econômicas, políticas e raciais. Hoje, a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil e 77% das vítimas de homicídio são da periferia das grandes cidades, com idade entre 18 e 30 anos.

Pintura do artista brasileiro Dalton de Paula, um dos destaques da exposição

Nos censos oficiais, as populações negras são as mais discriminadas quando falamos em saúde, educação, justiça, transporte e índices de mortalidade. “Por onde quer que olhemos, esse racismo estrutural, iniciado com o sistema escravocrata, ainda persiste “, disse Lilia, que montou a exposição com mais quatro nomes, Adriano Pedrosa, Ayrson Heráclito, Hélio Menezes e Tomás Toledo.

Um dos pontos mais interessantes do diálogo criado entre o Masp e o Instituto Tomie Ohtake, que juntos exibem mais de 400 obras de 210 artistas nacionais e internacionais, é a presença de mais de uma história sobre o que aconteceu nesse período no Brasil a nas Américas. Nas escolas, aprendemos sobre essa época terrível a partir de obras romantizadas, mostrando escravos musculosos, muito melhor tratados do que o que realmente acontecia de fato. Em muitas pinturas, bebês aparecem sendo amamentados pelas mães, outra sugestão ilusória: famílias eram separadas para que a comunicação nas fazendas ou mesmo a fuga fosse mais difícil. Muito pouco é dito sobre as inúmeras revoltas de africanos trazidos a força para o outro lado do Atlântico, dos Estados Unidos à América do Sul, e raramente a visão dos negros é retratada –  a ótica das obras é quase sempre do ponto de vista dos dominadores.

A exposição também mostra que o protagonismo brasileiro na escravidão fez com que desenvolvêssemos uma rica e profunda presença das culturas do continente africano por aqui. Afinal, nos navios negreiros, além de trabalhadores (que é o grupo mais enfatizado pela história), vieram também intelectuais, símbolos culturais, religiosos e filosofias ancestrais, hoje parte da nossa cultura mais empírica. Praticamente tudo o que hoje dizemos que é essência da cultura do Brasil vem de lá: da música, passando pela religião, dança e até as vestimentas. Hora de olhar novamente para as obras e reinterpretá-las com o que sabemos.

Masp e Instituto Tomie Ohtake: Avenida Paulista, 1578, e Rua Coropés, 88 – São Paulo. Até 21 de outubro

 

 

 

 

 

 

 

 

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